O termo grego
ekklēsia procede da justaposição da preposição
ek (fora de) com o verbo
καλέω (chamar). Na antiga Hélade, referia-se à reunião ou assembléia da polis ateniense, convocada pelo arauto (
κηρυξ). A
ekklēsia reunida na ágora representava o zênite da democracia da cidade-Estado. A função da assembléia era política, judicial, cultural, estrategista e social, e não necessariamente religiosa, como aparece até mesmo nos livros apócrifos de Judite, Macabeus e Eclesiástico.
Todavia, o sentido religioso encontrado nas epístolas neotestamentárias deve-se à evolução diacrônica do sintagma a partir da tradução das Escrituras hebréias para o grego comum da Septuaginta.
Ekklēsia fora empregada inúmeras vezes para traduzir os vocábulos hebraicos
ēdâh e
qāhāl, cujo sentido é “congregação”, ou “assembléia” em diversas passagens veterotestamentárias. Pelo fato de essas palavras designarem, juntamente com o substantivo
‘ām, o “povo”, a “congregação”, ou a “assembléia” reunida na presença de Yahweh,
ekklēsia desloca-se do

sentido secular grego para assumir entre os judeus da diáspora significado sacro, com o qual os piedosos judeus-helenistas passaram a designar o povo da aliança e a assembléia santa de Yahweh (Judite 6.14-12; 1 Macabeus 3.13). Apesar de haver uma estreita relação semântica entre
ekklēsia e
synagogē, o primeiro vocábulo se impôs como
terminus technicus não somente nas páginas do Novo Testamento, mas também após o fechamento do cânon das Escrituras Sagradas.
De modo geral, os hagiógrafos neotestamentários empregaram
ekklēsia para designar tanto a “comunidade dos redimidos”, ou igreja universal, como a “comunidade das origens”, ou igrejas locais. A primeira, designada como “igreja mística”, é católica, una e Corpo de Cristo, formada por todos os salvos. A segunda, intitulada “igreja local”, é antropológica, histórica e cultural, composta inicialmente por judeus palestinenses e judeus helenistas e, mais tarde, pela
ekklēsiai tōn ethnōn, igreja dos gentios ou das nações. Ela é mística, universal e também antropológica e local.
Enquanto a igreja primitiva estava ligada aos cristãos judeus em Jerusalém, freqüentava o Templo e as sinagogas para o culto, orações e homilias. A parênese de Tiago, escrita possivelmente na década de 40 d.C., e, portanto, um escrito pré-paulino, é um dos mais antigos testemunhos da “Igreja da Circuncisão”.
Nesse escrito, o termo
synagogē em 2.2 é usado numa ocasião em que a
ekklēsia cristã palestinense ainda não havia se afastado definitivamente dos costumes e da adoração sinagogal e templária. Razão pela qual em 1.1 e 5.14, a
ekklēsia é identificada com as “doze tribos da dispersão”, expressão que designa a igreja como o novo povo de Deus.
Embora nos Atos dos Apóstolos o vocábulo seja usado com diversos matizes, prevalece o sentido de “comunidade redimida” e “comunidade local”. No
corpus paulinum,
ekklēsia aparece como “igreja universal e mística”, e “igreja local e domésticas”. As igrejas locais e domésticas são comunidades de crentes compostas por diversas etnias que viviam espalhadas no contexto citadino da Ásia Menor. A relação entre a igreja doméstica e sua liderança carismática era tão íntima, que provocou entre os biblicistas uma controvérsia a respeito da identidade da
eklektē kyria na 2 Epístola de João. Na verdade, o estenógrafo dirige-se tanto a senhora eleita quanto à comunidade a qual, possivelmente, ela lidera. Em todo epistolário paulino, as igrejas locais, domésticas e citadinas são identificadas como pertencentes à comunidade universal dos remidos, cujos símbolos são: Corpo de Cristo, Templo de Deus, Noiva de Cristo, Família de Deus, Coluna e Baluarte da Verdade, Casa de Deus, Virgem Pura. Esses símbolos descrevem a unidade da igreja em toda sua diversidade. Todavia, escrevendo à igreja da Síria, a fim de ratificar a separação daquela comunidade com a sinagoga, Mateus apresenta o Senhor Jesus como o
oikodespotēs, ou Edificador da Igreja. A figura e apostolado de Pedro, o “homem-confessante” ou “homem-rocha”, é secundário diante daquele que edifica e sustenta a Igreja universal no
logion 16.18, ou daquele que instrui a igreja local em 18.17.
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